terça-feira, 2 de agosto de 2011

Entrevista: Daniela Camargo


Qual foi sua formação acadêmica como atriz? Quais eram os caminhos para a formação de um ator quando você começou a carreira? Era mais difícil que hoje em dia? Na sua opinião, o que seria uma sólida base para um ator (cursos, leituras, referências teóricas, atores icônicos, etc.)?
Comecei a minha carreira na EAD, Escola de Artes Dramáticas da USP, Universidade de São Paulo. Os caminhos para os atores nessa época eram algumas escolas de teatro, incluindo a EAD e a Unicamp, que tinha um curso novo, o qual eu também entrei. Mas, mesmo morando em Campinas, eu optei por estudar em São Paulo, pois já estava trabalhando com publicidade, quis ficar mais perto do mercado de trabalho. Não sei se era mais difícil, acho que hoje deve ter até mais opções. Acredito que uma sólida base só é possível com estudo, leituras, experiências e vivências, cursos etc. Nessa carreira você nunca para de se aperfeiçoar, estudar...

Para você, quais são os prós e os contras de ser atriz?
Os prós nessa carreira para mim é o não ter uma rotina definida, é a variedade de papéis que se pode experimentar, a possibilidade de conhecer pessoas, lugares e assuntos diferentes, de estudar, pesquisar sobre tudo isso e assim fazendo com que cada trabalho seja único. O maior contra acredito ser a instabilidade.

Antes de estrear em novelas, você fez teatro e trabalhou como modelo. Gostaria que você nos descrevesse seu percurso profissional antes da TV e de que forma este período te ajudou a chegar até ela. Aliás, a televisão já era um objetivo a se atingir?
Eu comecei a me interessar por teatro desde muito criança, me fantasiando, fazendo teatro em casa para a família... Queria me inscrever numa promoção para testes para a nova Narizinho de “O Sítio do Pica-Pau Amarelo”, mas minha mãe não deixou. Eu participava de todas as peças da escola, escrevia, dirigia... Quando fui assistir “Chapeuzinho Vermelho” no teatro, eu senti vontade de me levantar da cadeira e ir para o palco. Não queria assistir, mas fazer. Eu devia ter uns sete anos... Depois dessa peça, tentei encontrar cursos de teatro, mas não existia para crianças. Consegui o telefone da empresa que produzia peças infantis em Campinas, me disseram que tinha que ter dezoito anos. Eu só pensava nisso, em como eu iria sair dali e conseguir fazer teatro. Com dezessete anos, comecei a fazer publicidade, fotos e filmes. Esse caminho me ajudou a começar a trabalhar em São Paulo, daí a escolha da USP. A televisão não era um objetivo, mas ela veio rápido.

Sua primeira novela foi “Mico preto” (Rede Globo, 1990), onde você interpretou a Katy, filha de Fred (José Wilker). Como foi esta primeira experiência em meio a talentos como Márcia Real, José Wilker, Luiz Gustavo, Louise Cardoso, entre outros? Você se recorda da recepção do público a seu personagem?
Minha primeira novela foi especial, um conto de fadas. Eu estava dentro da Globo, ia agendar um teste quando cruzei com o diretor Denis Carvalho no corredor. Ele me viu, perguntou quem eu era, o que estava fazendo. Eu levava um book fotográfico comigo, ele olhou, chamou o diretor Paulo Ubiratan na sala, ligaram para o ator Marcelo Serrado para fazermos um teste na mesma hora. Eu saí de lá com o papel de Katy nas mãos. Peguei um ônibus para São Paulo e mal podia acreditar no que tinha me acontecido. Aquele foi o meu dia! Essa primeira experiência foi maravilhosa, começar a atuar com tantos atores veteranos, conhecidos, foi a continuação da escola que tive que trancar para fazer a novela. A recepção do público foi uma delícia e assustadora, pois eu não conseguia andar em lugar nenhum sem ser notada, principalmente quando ia para Campinas. No começo é difícil de se acostumar.

Logo após “Mico preto”, você participa de “Ilha das bruxas” (Rede Manchete, 1991). Como surgiu este trabalho? O que você gostaria de destacar nesta minissérie? Fale um pouco sobre esse trabalho.
Logo após “Mico Preto”, fui convidada para participar da minissérie "Ilha da Bruxas". Foi uma delícia esse trabalho, pois ficamos um mês inteiro em Florianópolis, que é um lugar maravilhoso. Aquilo tudo que falei antes sobre lugares, pessoas e assuntos diferentes se encaixa aqui. Estudamos sobre as lendas, estórias da ilha, enfim, só tenho boas recordações.

Um de seus trabalhos mais lembrados até hoje foi em “Vamp” (Rede Globo, 1991/92). A Lena é uma personagem com bastante importância na trama, fazendo parte do triângulo amoroso com Lipe (Fábio Assunção) e Natasha (Claudia Ohana). Com a reprise da novela pelo canal Viva, como você avalia seu trabalho nesta novela? Você está assistindo? Como tem sido a reação do público, muitos deles nascidos depois de 1991?
A novela “Vamp” realmente é um dos meus trabalhos mais lembrados mesmo. Essa novela foi um sucesso absoluto, foi uma inovação em vários aspectos. Ela marcou uma época e marcou a vida de uma geração de jovens. Com a reprise da novela, intensifica mais ainda o reconhecimento diário do meu trabalho, pois não tem um só dia sequer que alguém não me pare para cumprimentar, perguntar por que não estou trabalhando, que devo voltar etc. Eu era jovem e ainda inexperiente, mas acho que cumpri o meu papel. Eu não vejo a novela. Quando fiquei sabendo que ia reprisar, eu contei para minha filha de sete anos, pois ela sabe que sou atriz, e me pediu para ver. Liguei umas duas vezes, vi com ela, me fez muiiiiiiitas perguntas, estava curiosa para saber como era o meu trabalho. Foi bem legal e ela adorou me ver na TV.

Ainda sobre “Vamp”, é importante destacar que tanto nesta produção quanto em “Top Model” (Rede Globo, 1989/90) há evidente destaque a um elenco adolescente ou jovem, com poucos trabalhos na TV (no caso de “Vamp”, você, Fernanda Rodrigues, Bel Kutner, Pedro Vasconcellos, entre outros). Como era a abordagem destes adolescentes na época? As temáticas que esses núcleos traziam encontravam um diálogo com o público jovem? Você sente grande diferença na abordagem do jovem atualmente?
O que me lembro daquela época, do que diziam a respeito dos jovens, do universo em que eles estavam inseridos era mais leve, não tinha essa sexualidade precoce que existe hoje, violência. No caso da novela “Vamp”, tinha tanto bom humor que o diálogo com os jovens era muito agradável, era só diversão.

Na novela “Sonho Meu” (Rede Globo, 1993/94), você pôde interpretar uma personagem diferente das mocinhas que vinha fazendo (apesar de a Katy de “Mico preto” ter também um lado bastante rebelde). Francisca era uma personagem mais atirada, moderna e, da metade para o final da novela, teve boas cenas cômicas com Giácomo (Eri Johnson). Quais são as lembranças que você guarda desta personagem?
Adorei fazer a Francisca de “Sonho Meu”, tive muito retorno do público com esta personagem, era uma delícia, eu me divertia muito nas cenas com o Eri Johnson. E era a primeira personagem cômica, moderna, diferente das mocinhas anteriores.

Ainda sobre “Sonho Meu”, esta foi sua última novela na Rede Globo. Logo em seguida, você passa a trabalhar no SBT. Como foi a transição? Sentiu diferenças técnicas e/ou da reação do público ao mudar de emissora?
Quando terminei “Sonho Meu”, fui para Nova York estudar, passei quase três meses lá. Vim para São Paulo passar meu aniversário e recebi nesses dias um convite do Nilton Travesso para fazer “As Pupilas do Senhor Reitor”. Fiquei feliz com o convite na época, fui para NY para pegar minhas coisas, organizar tudo e voltei correndo, pois tinha que embarcar para Portugal para as gravações. Foi tudo muito rápido. A gente vai onde o trabalho está, e para mim foi muito bom trabalhar no SBT, não senti diferença. O importante era estar trabalhando com pessoas competentes, cheias de vontade. O clima e as condições de trabalho eram excelentes.

No SBT, você fez três novelas: “As pupilas do senhor Reitor” (1994/95), “Antônio Alves,  taxista” (1996) e “Os ossos do Barão” (1997). Felizmente, representam bem as três fases de teledramaturgia do SBT nos anos 1990: remakes bem-sucedidos, adaptação de textos argentinos e a posterior retomada de remakes. Gostaria que você comentasse o projeto de teledramaturgia do SBT na época, como foi sua participação em cada novela e quais foram os problemas e os sucessos que encontrou nesta emissora.
A Amália é uma das minhas personagens favoritas, eu mergulhei nessa personagem maravilhosa que me foi dada. “Antonio Alves, o Taxista” foi uma experiência boa, passamos quase cinco meses em Buenos Aires gravando. Tivemos dificuldades com a parte técnica, mas valeu a experiência. “Os Ossos do Barão” foi muito gratificante também, uma bela personagem, um grande elenco. No final da novela, já sentíamos que o SBT estava com dificuldades. Eu particularmente ganhei uma experiência muito boa nessa época.

Após sua passagem pelo SBT, você participa de três produções da Rede Record: “Por amor e ódio” (1997), “A história de Ester” (1998) e “Alma de pedra” (1998). Quais foram seus personagens nestas minisséries? Duas delas (“A história de Ester” e “Alma de pedra”) tinham viés fortemente evangélico, o que encontra grande resistência por parte do público e dos profissionais ainda hoje. Como lidar com este pré-conceito que pode prejudicar um trabalho antes mesmo de ser apresentado?
Meus trabalhos na Record foram bons, protagonizei essas três minisséries. Não tive nenhum problema pelo fato de a emissora ser de uma religião específica, não misturo as coisas. Oportunidade de trabalho, de exercitar o meu ofício, feito com profissionalismo, não vejo por que ter pré-conceito.

Ainda sobre seus trabalhos na Record, como foi o trabalho de pesquisa para os personagens bíblicos ou ligados à Igreja Evangélica? Houve diferenças de composição para com o trabalho que você desenvolvia até então?
Apenas para “A História de Ester” foi preciso estudar um pouco mais, pois se tratava de uma história bíblica.

De todos os autores e diretores com os quais você trabalhou, quem você destaca? Quais ensinamentos passados por ele(s) você carrega até hoje?
Gostei de trabalhar com todos os autores e diretores, estamos sempre aprendendo algo a mais, admiro o trabalho de todos eles, não poderia destacar ninguém.

Sua última aparição como atriz foi no filme “Fim da linha” (2008). Como surgiu o convite? Foi sua primeira participação em cinema? O que você destaca como importante neste trabalho?
O filme “Fim da Linha” surgiu através de um teste via agente. Foi minha primeira participação em cinema, sim. Foi uma experiência muito gratificante, pois tinha muita vontade de fazer cinema, adorei! Gostaria muito de trabalhar em novos filmes.

Inevitavelmente, com a reprise de Vamp, surge a curiosidade: o que você tem feito hoje em dia? Ainda trabalha no meio artístico? Sente saudades de atuar? Tanto tempo longe da televisão foi uma opção ou uma imposição? Por quê?
Atualmente eu não estou atuando, me dedico completamente na educação dos meus filhos, tenho uma menina e um menino. Depois da minha primeira filha, eu tentei voltar ao mercado de trabalho, mas ai veio o segundo... Por opção, resolvi me dedicar só a eles por serem pequenos. Acho que essa resolução foi muito importante, pois participo ativamente da educação e criação dos meus filhos. É claro que sinto saudades, vontade de atuar. Agora, aos poucos, começo a pensar em voltar a trabalhar.

Como você analisa o mercado de trabalho do ator atualmente?
Acho que o mercado de trabalho está sempre crescendo, com muitas possibilidades, muitas produções. Acho que tem mais espaço, ao mesmo tempo, cada vez mais gente batalhando por esse espaço. Acredito que continue tão difícil quanto antes conseguir trabalho.

O que tem achado das novelas atuais? Você as acompanha?
Eu não acompanho novela há muito tempo. Sei o que esta acontecendo pela mídia, acompanho as notícias somente.

(por Beatriz Villar)

http://natvcritica.blogspot.com/2011/07/entrevista-daniela-camargo.html

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